quarta-feira

Português – VI
Estudo da Narrativa Confessional, ou Prosa Poética Desvairada.

Cara Professora Celise,

Com o passo pesado fui pra casa hoje decidindo a vida, e durou quinze minutos até eu me perder em opções impossíveis, terminei dois livros e não sei de mais nada, ou sei que quero continuar rabiscando e empurrando com a barriga para ver onde vai dar pé, na verdade nem quero ver o tal do pé porque ando com um medo descomunal de me mexer de mim mesma, ou é a preguiça que nasceu comigo e que se confunde com meu nome. Preguiça e urgência, meus dois pólos de conflito que se amam, e eu não amo mais as coisas que eu amava e dei vários passos pra dentro do escuro do poema e nele agora eu me mantenho quente, já querendo mudar a direção. Como sempre me coloco inteira reticente e reticências, cheia de um vazio de várias coisas e de uma coisa só procurando voz e canal pra sair e povoar o mundo como pedra milenar em queda no abismo. Povoar o mundo com meu DNA loiro e torto de vida e deslumbre. Descobri que meu eu profundo cheira a grama molhada, e esse meu eu, que agora não é mais Eu, saiu pra comprar cigarros e nunca mais voltou, um de nós ficou com a Determinação, e creio que não foi Eu. Isso é crise de ócio e vontade de romance. Cadê o meu ray-ban? Atrás dele eu escondo minha multidão.
“ta pensando em quê?
Na vida da gente, Eulália.
E não ta boa, Tiu?
Se ao menos eu conseguisse escrever.
Escreve de mim, da minha vida antes de eu te encontrar, da surra que o Zeca me deu, da doença quele me passou, da minha mãe que morreu de dó do meu pai quando ele pôs o fígado inteirinho pra fora, do nenê queu perdi, do Brasil ué!
Escrevo sim, Eulália, vou escrever da tua tabaca, do meu bastão.
Não fala assim benzinho, só quero ajudá.
Deita-se de bruços, chora um pouco, depois soluça, aí pego a pena de papagaio, uma daquelas com pluminhas verde-amarelas, e assoviando o hino nacional vou espenando sua bundinha, espeto a pena no anel, devagarinho vou alisando a lombada das nádegas, e Eulália se ergue e se arreganha lassa, então vou entrando na mata e deixo as polpas pra pena, bonito ali enfiado, gozo grosso pensando: sou um escritor brasileiro, coisa de macho, negona.
Vamos lá.”

Um comentário:

  1. Vez em quando seu Eu determinado bate na minha porta, ja passou 15 lindos dias comigo.
    Mas ai foi comprar cigarro e nao voltou

    e cheira a "alecrim e hortela"

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Mente que eu gosto!